Iggy Pop é o típico cara que muitos conhecem, respeitam e dizem ser um cara legal, como o pai do punk e um velhinho muito elétrico, mas poucos preocupam-se em ouvir tanto sua carreira solo tanto seus três seminais discos no Stooges.
E para os que conhecem sua banda, vêem o tamanho da heresia que é chamar a banda de "dinossauros do Rock" - ainda hoje, o som deles foi algo poucas vezes equiparado. Há 40 anos, James Newell Osterberg, ex-baterista do The Prime Movers, um moleque que cresceu em um trailer, substituiu seu futuro flerte Kate Asheton na banda que seus irmãos, os deliqüentes Ron na guitarra e Dave na bateria, estavam formando. A formação era completada por Dave Alexander, um garoto que desde os 12 anos já cometia pequenos furtos e cheirava cola. O nome do grupo, como quem gosta deve saber, veio daquele saudoso trio, Os Três Patetas (The Three Stooges) com toda a sua violência engraçada e ingênua. Porém, esses caras não eram nem um pouco engraçados e ingênuos... Eram feios, pobretões, encrenqueiros, viciados... O tipo de gente que sua mãe não quer que acompanhe você.
A banda teve a produção seu primeiro LP, auto-entitulado, sobre a batuta de John Cale, do Velvet Underground. Em 1969, só os MC5 tinham a mesma fúria. Mesmo com um som extremamente poderoso pra época com riffs tão elétricos que pareciam vir de uma guitarra entrando em curto, Cale havia dosado o som da banda. E ainda queria convencer os novos empregados da gravadora Elektra da necssidade de fazer sucesso entre o público alternativo para ser respeitado. Daí surgiu um tema vanguardista - chamado "We Will Fall" - com seus sombrios, chapados e pervertidos dez minutos de duração. No resto, o pau comia solto, mesmo em volume menor ao que os Patetas estavam habituados.
Entre trancos e barrancos, a banda partiu para seu segundo disco, em meio à muita esbórnia, hedonismo e putaria. O produtor foi Don Galucci, ex-tecladista do Kingsmen, uma das primeiras bandas de garagem, autêntica influência dos Stooges, que cravou um único hit na história do Rock - "Louie Louie", uma homenagem à todas as "damas da noite" da beira do cais... Ele fez o que era certo para esses malucos - deixou suas cabeças chapadas de tanta cocaína, heroína, anfetamina e LSD parirem o som que bem entendessem. Então Ron ligou o volume de sua guitarra no máximo, distorceu-a o máximo possível, Dave Alexander começou a golpear seu baixo como se fosse um instrumento de percussão e Scott pegou suas baquetas e bateu... Mas bateu muito muito na coitada da bateria. Iggy Pop então começou a berrar, berrar e berrar. Os gritos mais demenciais que conseguia. E ainda contaram com a ajuda de Steve Mackay, um saxofonista porra louca. O nome do disco resultante dessa piração veio do apelido dado à casa que os Stooges utilizavam para ensaiar, drogarem-se e treparem com centenas de groupies. E que resultado foi esse?
Um disco totalmente imprevisível, que não se parece com nada que veio antes ou depois. Descompromissado, pirado, distorcido, marginal - mostrando a violência que os Rolling Stones só representavam. Uma verdadeira anti-música, caótica, desorganizada, irracional, confusa, sem direção definida, sem forma exata.
Lançado em 1970, "Fun House" marca toda uma era - só não me pergunte se ela encerra o sonho hippie ou dá início à todo o niilismo da Blank Generation.
A primeira música, que as bandas normalmente utilizam como cartão de visitas, não é cartão de visitas pra ninguém. "Down On The Street" tem um riff abafado e psicótico, até Iggy completar o esporro com sua voz esquizóide. Sem noção nenhuma do que poderia ser diafragma, falsete, sustentação de notas, ele apenas berra, geme, enquanto a guitarra ruge, cheia de ruídos, uma verdadeira música feita pra incomodar. Iggy fala sobre todas as garotas que encontrou pela noite, todas as falsas juras de amor e todo o sensualismo escandaloso das garotas.
"Loose" é iniciada com mais espancamentos de bateria, mais um riff de guitarra que vai escalando a montanha até rolar a mesma e tornar-se uma avalanche de sujeira. Dos gritos empolgados, passando pela voz rasgada, chegando ao refrão em tom pervertido, e um solo que solta os bichos. "Eu consegui uma gravação de música bonitinha/Eu fui abaixo e baby, você pode falar/Eu consegui uma gravação de música bonitinha/Agora estou pondo isso pra você direto do inferno", vocifera Pop.
Falando em vociferações, gritos, berros e despinguelamentos: lhes apresento "T.V. Eye", a canção com um dos berros mais primais de toda a história da música - sim, a canção que Iggy grita "LOOOORD" no início. E Ron dispara um dos riffs que definiram o que é rock pesado, violento e em estado bruto. A bateria entrando em galope é uma voadora na garganta. A irmã de Ron e Scott, Kathy, usava essa expressão T.V. Eye (sigla de Twat Vibe Eye) quando ela estava com desejo por alguém ou quando um garoto dava aquele olhar cheio de segundas e terceiras intenções pra ela. Quando um músico pervertido feito Iggy Pop descobriu o significado dessa expressão, claro que ele tinha que fazer uma música com esse nome! E ele, entre rugidos apocalípitcos e vocais rasgados, conta o seu caso com uma garota que está olhando cheia de desejo pra ele. E chega de explicação... Energia não se define; energia é sentida.
"Dirt" é introduzida pela bateria, somada a uma ótima linha de baixo, revelando uma das canções mais lentas do álbum. A guitarra, extremamente berrante, parece esfaquear o ouvinte aos poucos, e com vontade. Ouvir um álbum dos Stooges no máximo é sensação certa de sentir o ouvido sendo perfurado. E Iggy, com a voz arrastada, parecendo que vai cair no chão, canta coisas como "Eu tenho estado sujo/E eu não me importo",e "Porque eu não me importo/Eu estou apenas sonhando essa vida/E você sente isso?/Disse, você sente isso quando me toca?". O solo de Ron é impressionante, a parte mais elétrica e aguda da canção. "Play it for me, baby, with love!"
Os malucos de Ann Arbor tinham o costume de nomear algumas de suas canções com o número do ano em que foram lançadas. Essa é a origem do título de "1970", canção esta que é iniciada por mais um berro alucinado de Iggy, e a velocidade é retomada, com os riffs torturantes de Ron e o ritmo bate-estaca criado por Dave e Scott. "Bonita garota/Alimentou meu amor a noite inteira/Até eu me mandar/Me mandei a noite inteira" diz Iggy, sem arrependimento nenhum, como pode ser visto no refrão "Eu me sinto bem!". E o saxofone surge de repente, imprevisível, veloz e no limite, puxando o ouvinte pelo pescoço para que ele caia no caldeirão de violência e loucura.
Entra a faixa título "Fun House", a mais longa do disco, com o saxofone iniciando a canção de forma tão aguda e tão repentina quanto um flato, que pode fazer o ouvinte pular da cadeira. Quase oito minutos de tudo o que o álbum é está aqui: berros desesperados, distorções, riffs rápidos e insanos, letra pervertida, uma parede sonora inconstante e violenta, guitarras crescendo e retraindo-se enquanto os versos decorrem. Nenhum instrumento está exatamente em coesão ou harmonia com o outro. Nenhuma estrutura a ser seguida. "Sim, o garoto da Funhouse vai roubar o seu coração. Eu vim jogar, baby".
E "L.A. Blues" não é exatamente rock. Não é nem exatamente música. Não tem letra, riff. É apenas um bando de notas de baixo, guitarra e saxofone, batidas desconexas e berros completamente pirados que completam quase cinco minutos. Não dá pra falar se tem uma parte mais pesada ou mais arrastada - é uma profusão de climas e ritmos simplesmente horripilante.
Os Stooges gravaram a trilha sonora para os últimos dias do mundo. A trilha do apocalipse viria três anos depois, em "Raw Power", mas "Fun House" é totalmente fantástico, é até um crime dizer que um álbum dos Stooges é melhor que o outro. Mas esse, com certeza, é o mais livre de amarras - o primeiro não tinha tanto volume e "Raw Power" não tinha tantas drogas... Um dos registros definitivos de toda a música, mostra como era toda aquela geração sem futuro filha da Segunda Guerra e vivente da repressão de Nixon e da violência do Vietnam.
"Foi basicamente um álbum ao vivo no estúdio. Paz e amor não fizeram muita parte dele. No fundo a gente não se importava muito em fazer alguém se sentir bem. Estávamos mais interessados no que estava acontecendo realmente, na merda tediosa que era e no jeito que você era tratado. 'Dirt' é um exemplo perfeito disso. Sabe como é: 'foda-se toda essa merda, somos lixo, nós não nos importamos'" (Scott Asheton)
Marcadores: Resenhas
11 Comments:
Puta que pariu!
Esse é "o disco"!
Incrementar Steve Mackay na banda foi a melhor coisa que os Stooges fizeram.
Disco que vai do Garage Rock/Proto-Punk as improvisações do Free Jazz.
É realmente sensacional.
Destaque para toda a loucura dos 5 integrantes juntos em "L.A. Blues".
chamar qualquer um de 'dinossauro do rock' me irrita tanto ¬¬
hoho, iggy é o cara!
ahh, eu só tenho o raw power ~:
mas ficou boa a resenha (puxação de saco pouca é bobagem)
Iggy pop é o cara!
tá, isso já foi dito.
hahah eu acho muito engraçado a expressão "dinossauros do rock", sempre imagino um monte de Tiranossauros rex tocanddo guitarras e berrando em gutural... hahaha
parabéns pela resenha, abraços e até mais
nossa, faz séculos que não ouço. mas esse disco é doido. \õ/
dance to the beat of the living dead, lose sleep baby and stay away from bed, raw power is sure to come, a running to you.. :BBBB
bela resenha beeeeer
Esquizofrenia, Stooges, pauleira, insanidade, letras horripilantes e muita malícia. Uau, isso é rock dos bons, bish.
O álbum manda todos os ouvintes à merda, pra depois pegá-los com sua insanidade e deixá-los também esquizofrênicos, o som no último volume também ajuda muito. A voz rasgada de Iggy, a (des)(h)armonia das notas distorcidas e aterradoras... é uma violência para os ouvidos dos menos avisados.
esse cd é insano e Dirt é uma das músicas mais loucas que eu já ouvi,dá vontade de matar....hehehe!
Eu tenho esse CD, mas não ouço há um bom tempo. Aliás, ultimamente tenho achado alguns ótimos cds que não ouço há 100 anos.
Abraço
Luis
http://luismilanese.wordpress.com
yeah \m/ stooges é do caralho... e vc mal se ouve falar =x soh pq eles eram trash po? XD huahauhuahuahuahau
curto pacas
resenha porretcha
AWAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAY
x@@@@
Talvez eu possa afirmar que Fun House é meu álbum preferido de todos os tempos. O maximo de energia e destruição que uma banda ja conseguiu alcançar, fantastico!
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