"Alguém me disse pra ir no CBGB's pra ver a melhor banda do mundo, os Dead Boys. Então fui lá uma noite quando eles estavam tocando, entro e a primeira coisa que vejo é Stiv sendo chupado no palco. A primeiríssima coisa." (Bebe Buell)
Jovem, barulhento e arrogante.
Se uma banda com o singelo nome de garotos mortos soltar um registro com um nome desses, é melhor não desconfiar de nenhum dos três adjetivos. Mas, num mundo ainda dominado em sua maioria pelo rock progressivo e polido, quem iria dar bola para cinco rapazes pobretões crescidos em gangues e meios violentos afins, em Cleveland, Ohio? Restou aos rapazes do Frakenstein mudarem-se para New York e adotarem o nome que inscreveria seu nome nas notas de rodapé de qualquer boa enciclopédia sobre rock após Joey Ramone conseguir datas para eles no lendário CBGB's.
Tão rápido quanto surgiram, os Dead Boys desapareceram, não durando nem meia década; O grupo do vocalista Stiv Bators, um fã inveterado de Iggy Pop (e, segundo o próprio, aquele que jogou amendoim para Iggy se lambuzar no início dos anos 70), os guitarristas Cheetah Crome e Jimmy Zero e a cozinha do baixista Jeff Magnum e do baterista Johnny Blitz era exatamente o que imaginávamos de um grupo punk na época: encrenqueiros, junkies, marginais, entre outros adjetivos que você já sabe.
Para ficar mais bizarro, somem-se ainda aos fatos de o grupo adorar chocar visualmente com suásticas nazistas, discutirem com a própria produtora Genya Ravan (que era judia) por causa do mesmo motivo, Stiv mostrando a bunda para os Ramones quando os mesmos saíam de Cleveland, ainda Stiv e Jimmy Zero raspando os pentelhos da groupie Eileen Polk em forma de suástica e tirando fotos, para em seguida sair correndo pelo hotel em que estavam hospedados, de novo Stiv sendo zoado por Iggy Pop por estar chapado de Quaaludes, sem contar o evento que abre esta resenha contado por Bebe Buell, no qual Stiv recebeu um belo trabalho de boca de uma garçonete, após a mesma lambuzar o seu... er... 'menino' com creme batido. E após o fato, Stiv não se deu por satisfeito, amarrou o cinto na tubulação de gás e se enforcou, ameaçando se suicidar. Se na época não estavam mortos, pelo menos era o que a maioria das pessoas queriam (e eu só não conto que eles colocaram "Wheels Of Fire" do Cream pra assar no fogão para não sobrecarregar o leitor de informações, ou quiçá fazê-lo odiar os meninos...).
O som, basicamente, foi uma das primeiras crias geradas pelo mau-mocismo de Stooges, New York Dolls e Rolling Stones. Estão lá o volume alto, as guitarras distorcidas, os versos cuspidos, os refrões esgoelados, o blues-rock dos anos 50 em velocidade estonteante...
O esporro niilista e prepotente é iniciado em "Sonic Reducer", onde os pratos da bateria soam altos, as guitarras injetam adrenalina nas veias e Stiv Bators destila um pouquinho de toda a sua insolência punk em versos como "Eu não preciso de ninguém/Não preciso dos meus pais/Não preciso de uma carinha bonita/Eu não preciso da raça humana/Eu tenho algumas notícias para você/Também não preciso de você". Extremamente viciante, para ser bradada com punhos ao alto, ou então simplesmente delirar ao som quando se quebra o esqueleto.
Mais pé na porta, mais soco na cara, mais abuso saindo pelos altos falantes. Como a própria música diz, "All This And More", que começa melódica e vai ganhando guitarras pesadas, com uma letra bastante abusada sobre sexo e com a banda gritando no refrão de que eles são apenas garotos mortos. Na voz de Bators e na guitarra de Cheetah, qualquer melodia que pudesse surgir das suas cabeças é prontamente transformada em um hino abusivo.
"What Love Is", uma das mais curtas do álbum, onde Sitv canta como subjugar uma mulher. Música incansável, rápida e distorcida, com uma letra curta e mais direta o possível e um refrão onde todos berram. O leitor mais sedento por novidades provavelmente pensará "nossa, a música deve ser um clichê completo"... Mas, felizmente, é um clichê que funciona. A vibração é irresistível.
De início lento, a bateria dita o ritmo da música com precisão, e quando Johnny Blitz começa a exagerar nos bumbos de "Not Anymore", as guitarras ganham corpo para que Stiv possa continuar contando como é a vida de um indigente. "Mas eu não me importo/Vá e me empurre/Você não pode me machucar/Não mais". A mais branda do álbum...
"Ain't Nothin' To Do" é um verdadeiro perfurador de tímpanos. Um riff extremamente alto soma-se com uma letra que fala sobre o tédio, esse um dos principais problemas que atingem os americanos todos os dias há décadas. É uma daquelas que não deixam espaço para meio termo. Ou você acha que é muito barulho desnecessário, ou acha que foi agraciado com a oportunidade de receber toneladas de riffs vigorosos, libelos indecorosos e loucuras mais do que inacreditáveis.
"Flashes quentes queimando no meu cérebro, sua língua me deixava louco (...) E todo mundo sabe que você foi pega com a carne na sua boca". É exatamente o que o leitor pode pensar, "Caught With The Meat In Your Mouth" trata de sexo oral. Rugidos empolgados somam-se ao riff mais rápido do álbum para que o vocal possa gritar mil e uma safadezas. O maior hino da curta carreira do grupo também serviu para ser sonoplastia do célebre evento em que Stiv recebeu um belo blowjob with cream de uma garçonete.
Mais uma cotovelada na boca do estômago. "Hey Little Girl" só pode ser definida como "esporro 'n' roll". Não chega a ser uma experiência tão chocante como ouvir um disco dos Stooges, mas a parede de guitarras e os vocais selvagens e animalescos com certeza garantem que quem gosta de um rock pesado e direto vai virar cambalhota ouvindo essa beleza.
"I Need Lunch" tem um início cativante apenas de voz e guitarra, onde o clima meio 1972 logo vai para 1977 quando Blitz começa a maltratar sem dó a bateria. E Stiv continua com putaria... "Eu não quero realmente dançar/Eu quero apenas pegar na sua calcinha" e "Eu preciso de almoço/Me alimente!". O vocal do rapaz vai se tornando uma máquina de berros rasgados e guturais a medida que a canção vai pesando. Surpreendente.
Um grande riff abre "High Tension Wire", que logo deixa a música entrar em trilhos punks, mesmo assim sendo uma das mais rock 'n' rollers do álbum. E Bators declara que esta noite, ele está atacado, o cérebro está queimando e ele é um fio de alta tensão. Estraçalhante em todos os sentidos, rock dos bons para ser gritado além do limite do aceitável!
E mais um registro clássico da Blank Generation termina com a música "Down In Flames", dessa vez assumindo um lado mais punk. Acordes abafados, poucos variados e graves agem em grande velocidade para que Stiv tenha uma de suas melhores performances do álbum. A cozinha atua com densidade extra aqui, e na letra eles parecem falar da origem do fim de todos os garotos mortos existentes no mundo. Meninos assustados de uma possível guerra nuclear, junkies ao extremo e que sempre terminam ferrados da mesma maneira - mortos, alimentando os mortos e com o cérebro morto.
Com certeza os Dead Boys não foram o principal destaque da geração em branco criada por Richard Hell, mas a inconseqüência, o descompromisso, a fúria, a safadeza, está tudo lá - com roupas de couro e suásticas para deixar o ouvinte conservador mais ofendido ainda. E a banda foi se desfazendo, alguns de seus membros morrendo, outros chegando muito perto disso, o que exclui qualquer possibilidade volta. O que resta é ouvir e delirar com essas 10 músicas em mais ou menos 28 minutos. Para quem é chegado numa safadeza e em pose de bad (ou seria dead?) boy, esses punks de Cleveland descobrem as meninas com a carne deles na boca e os ouvintes com a música deles ajudando a ensurdecer o entusiasta de um legítimo disco de rock, que apesar dos 30 anos, continua com vigor e ousadia.
Marcadores: Resenhas
8 Comments:
gostei
soulseekeando \o
Hnn nem gostei.. bandinhas assim tem mais é que morrer mesmo :/
Bela resenha, puto.
Os garotos mortos não são uma doçura de gente? Como diria titia: "toisinha mais cute cute da titia!"
* * *
Eles só esqueceram a sutileza em casa e fizeram um rock desgraçado e doloroso, minha gente.
fodaa
sem duvida uma das melhores bandas dos anos 70 *-*
parabéns pro blog \o/
Dead Boys é foda DEMAIS
sonic reducer
i aint no loser!
só que o we have come for your children é mais... nao sei, é mais gostooooooooso de ouvir!
;*******
não me lembro de já ter escutado essa banda.
vou procurar algo pra baixar :D
Eu nem li tudo, mais espero que algum dia eu tenha ido no CBGB's em uma vida aí ;)
Faz mucho tempo que nao te vejo.
Beijasso, gi (/marvelette)
Cara, nunca pensei que veria isso na vida! Uma resenha do disco dos Dead Boys, que não conheço ninguém que conheça e falando tão honesta e fodamente.
Tá de parabéns, fío.
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