O que não é nenhum segredo para os fãs de música Industrial é que o KMFDM é uma verdadeira instituição pesada do estilo. Uma das primeiras bandas a investir na mistura entre Heavy Metal e música eletrônica, ao lado de gente como o Ministry e o Front 242, a banda já existe há mais de 25 anos e há pouco mais de dez anos vem lançando verdadeiras obras-primas (como "Symbols", "Adios" e "Attak").
O penúltimo trabalho 'full-lenght' da banda, de 2003, leva o nome de "WWIII", uma sigla para "World War Three" ("Terceira Guerra Mundial"), sucedido por "Hau Ruck" de 2006, é o melhor trabalho da banda na minha opnião. O encontro perfeito das guitarras pesadas, da eletrônica sombria e das letras sinceras, corrosivas, críticas e urgentes. Tudo isso guiado pelo line-up do fundador alemão Sascha Konietzko (vocalista, baixista, programador, sintetizador e percussionista), Lucia Cifarelli (vocais e "tudo que faça barulho", segundo a própria), Jules Hodgson (guitarrista, baixista e tecladista), Andy Selway (bateria e chimbais) e Steve White (guitarrista), além de Raymond Watts, um membro-chave da banda que sempre colabora no disco na composição e gravação.
Tudo começa com a faixa-título "WWIII", que após uma melódica introdução, revela ser uma das melhores músicas de toda a carreira da banda, ou seja, porradaria industrial, com guitarras beirando o Thrash Metal, com Sascha atirando para tudo quanto é lado, como se pode ver nas estrofes "Eu declaro guerra no mundo/Guerra no espaço/Eu declaro guerra em uma casca de noz/Guerra em todos os lugares", "Guerra contra os embaixadores da pretensão/Guerra contra a MTV e a CNN/Mc Donalds, Walt Disney e Bethlelem/Contra Christina, Britney e Eminem" e "Eu declaro guerra no munda da anti-escolha/Da unilateralidade violenta/Da aglomeração de brinquedos assassinos ultra-tecnológicos/E todos os crimes contra a humanidade", descambando no grito de Lucia "Terceira guerra mundial/Seja você tudo que você pode ser", mostrando esse ser um refrão mais do que raivoso e viciante. Uma das maiores pérolas da música industrial.
O álbum continua com a maravilhosa "From Here On Out", que se não tem o nervosismo da anterior, tem ótima letra e um refrão dito em tom ousado. As guitarras continuam pesadas e uma performance vocal excelente de Lucia. A banda continua o massacre lírico com versos como "Sem piedade/Você é o que você acredita/ E você é incompleto" e "Não convide sua própria destruição/Isso é uma estrada sem retorno". Para quem não parou no tempo em relação ao que foi feito com a música pesada, uma ótima música, com um pré-refrão que gruda na cabeça: "Queira o que você quer/Quando você quiser isto", repetido sem parar.
No dia 20 de Abril de 1999, dois jovens vítimas de provocações entraram atirando em uma escola em Columbine. As bandas que mais foram acusadas de influenciar os dois jovens (quando eu, você e todo mundo sabe que a influência na verdade é da enorme campanha que os EUA faz à favor da violência, incentivando, manipulando e fazendo guerras e o facílimo acesso às armas promovido pela National Rifle Assocation como "proteção pessoal") foram Marilyn Manson, os alemães do Rammstein e o próprio KMFDM. "Blackball" parece falar sobre o assunto da mesma forma que Manson fez na maior parte das canções de seu álbum "Holy Wood (In The Shadow Of The Valley Of Death)", ou seja a indireta mais direta possível. Um início mórbido dá lugar a uma música industrial carregada de efeitos sombrios e o vocal indignado de Sascha, mandando ver nos versos "Eu sou o falso atrás da sua porta/O pequeno verme que você ignora" e no pesado refrão "Bola negra/Inicie a revolução/Eles nunca nos manterão quietos/Bola negra/Sacuda o script/ O véu do silêncio precisa ser rompido/Bola negra", com a "bola negra" sendo uma possível referência à uma bala de revólver. Uma letra quilométrica que não deixa pedra sobre pedra, mostrando toda a fúria e ódio que sentem os excluídos e humilhados, e todo o silêncio a qual eles são submetidos.
"Jihad" tem uma das melhores letras do KMFDM, com Sascha entrando sem piedade ao cantar "Homo sapiens, uma espécie em extinção/Pobre, doente, estúpida, entorpecida, bosta alimentada", com a letra parecendo propor uma "Jihad", ou seja uma guerra final contra os poderosos, o que ganha força em "Todos façam sua parte/ Esperança é vida e fogo ao coração" e nos versos finais "Poder e regras plurais/A hora final de ricos gordos de bolas pequenas/Um grande último gole, final do império/Descarga de ditadores para dentro do ralo". Um arraso, com um teclado mais do que marcante, guitarras novamente nervosíssimas e as batidas eletrônicas parecendo soldados marchando impiedosamente.
A próxima é "Last Things", outro mergulho em um mundo incoformado de peso e fúria, guiado pelos vocais quase discursados de Lucia, com o refrão "Últimas coisas/Eu não dei nada em retorno/Levante-se para uma causa/Dê permissão para uma guerra muda" e os versos "Religião, esquerda e direita/Cabeças de estado poderosas e esfomeadas/Morte melancólica, queda do nosso nêmesis/Os fortes sobreviverão ou então digam nossos presidentes". O desempenho de Lucia nessa música não é à-toa, já que é sua música preferida para cantar ao vivo. Como todas as músicas ao longo desse álbum, cheia de passagens viciantes, uma das marcas registradas da banda desde sempre.
"Pity For The Pious", arrastada e mórbida, é uma avalanche de ironia, com o vocal de Sascha sendo o complemento perfeito. A letra parece falar de toda a enganação religiosa que as pessoas parecem passar, com o verso, discursando contra toda a decadência das organizações religiosas, inclusive com gemidos e gritos desesperados de Lucia no momento mais tenso da música, provavelmente representando os polêmicos casos de padres pedófilos. Terrivelmente realista.
Ouvimos então "Stars And Stripes", uma referência mais que óbvia à bandeira dos Estados Unidos, onde em uma pancada industrial pesada feito concreto a banda ataca Bush: "Um tirano é um homem que não permite liberdade ao seu povo (...) Controlado pela luxúria do poder" e a estrofe final "Sensação totalitária da mídia/ Você os dará dominação/Esqueça se te chamarem de mentiroso e ladrão/Agora você é um indisputável chefe no comando". O duo vocal de Sascha e Lucia está mais do que marcante, com a vocalista tornando o refrão da música mais do que marcante.
Mais peso ainda em "Bullets, Bombs and Bigotry", com bases de guitarra que rivaliza com a da faixa-título em termos de peso, e com linhas vocais intimidadoras de Sascha, declamando versos mais do que realistas como no refrão "Pecado, sexo, sodomia/Hora de acabar com essa paródia/Terror, tortura, tirania/A carcaça da democracia/ Poder, pílulas, perversão/Vitoriosos re-escrevem a história/Balas, bombas e fanatismo/Prenda você mesmo para a terceira guerra mundial". A bateria está mais vigorosa do que nunca nessa canção. Bordoada de primeira na orelha, um prato cheio para os fãs do estilo.
"Moron" é iniciada por uma risada sarcástica, com um riff poderoso e linhas vocais de Sacha que, se menos mórbidas, agora apostam em um tom mais irônico em suas declamações. A letra fala parece falar de toda a cultura violenta e apoio ao armamento desnecessário, como dizem os versos "O dinheiro fala e os merdas andam/Vendi meus direitos/Trocando por armas para a batalha". Uma avalanche de sarcasmo, literalmente impressionante.
O álbum começa a caminhar para o seu final com "Revenge", que abandona um pouco o peso das anteriores, pelo menos em um primeiro momento. Depois, o peso invade a sua estrutura, formando uma considerável fortaleza em sua parte sonora. A letra parece falar da própria terceira guerra mundial acontecendo, ou então sobre a subversão de valores que acontece nesse novo século. Os teclados estão mais do que bem postos, sendo um complemento perfeito para essa música que primeiro faz agitar, para então fazer pensar. Lucia, ao aparecer no final da canção, dá um show como sempre.
O final vem, ironicamente, com o título de "Intro", que começa com uma bateria em ritmo de marcha, onde a banda introduz ela a quem não conhece de uma forma totalmente irônica, talvez a forma como os outros tentam ver a banda, apresentando integrante por integrante e repetir os refrãos "Aqui estão os biscoitos/Pedra sólida contra o fluxo/Batida ultrapesada de luxo/KMFDM, uma merda eterna" e "Aqui está a sua voz do underground/Esteja pronto para outro round/ Nada novo, é sempre a mesma merda/Se isso funciona bem, porque foder com isso tudo?". Merece destaque a engraçadíssima parte em que Sascha canta "Eu sou Kap'n K, o corruptor da juventude/Minhas letras são o fantasma da verdade honesta/Eu sou o pai do Rock industrial/E se você não acredita em mim,/você pode chupar o meu...". Só não termino de traduzir porque isso aqui é um blog de família...
Enfim, excelente. O heavy metal industrial é um dos poucos estilos em que os artistas conseguem manter a integridade, tanto lírica quanto sonora, por mais de uma década, sem perder a força criativa ou o apelo urgente das letras. E o KMFDM, além de Nine Inch Nails, Ministry, Marilyn Manson, entre outros, são os melhores exemplos disso, junto a bandas mais recentes como o Rammstein e o Deathstars. Para quem não sofre da síndrome de ficar preso no passado, lembrando de "como os tempos em quais eu nem tinha nascido eram bons", e gosta de letras inteligentes e de conteúdo, o KMFDM é uma banda não apenas obrigatória, mas necessária. Um oásis de boa música.
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10 Comments:
humm...interessante
ae. algo que eu goste! XD
KMFDM é muito, muito bom. nine inch nails, rammstein, marilyn manson, enfim.
ótimo post!
:*
ahh eu nunca ouvi essa banda aí, mas pelo jeito parece ser legal... heavy metal com música eletrônica, da hora \o
vou procurar alguma coisa pra baixar
:D
Bjos
Cara, paguei um pau pra essa resenha. Como sempre, Zero falando com propriedade. ^^
Esse CD do KMFDM é o melhor! Os caras mandam muito bem.. principalmente nas faixas "WWIII", "Blackball" e "Jihad". Altamente recomendáveis.
E pra quem interessou, os álbuns "Hau Ruck" e "Symbols" também são ótimos. Mandem ver.
Ver esses caras misturando heavy metal com música eletrônica dá até desgosto, mas me mande uma música deles.
Eu não gosto de música eletrônica, provavelmente não vou gostar dissaê.
DKoRn
Parabens..fodôniva essa resenha...
Realemente esse cd do KMFDM emuito foda..quem nao tem vale a pena correr atrás...
"Jihad" e perfeita..viçiante..hahaha
Parabens Zero pela resenha..tomara que tenhas outras desse tipo..Rs..
Ber, o que falar desse post que pra mim foi o melhor que já li de você. Não apenas por citar TODAS as minhas bandas favoritas e falar sobre a integridade do metal industrial mas também por ter analisado e feito essa resenha gloriosa que com toda certeza, se fosse mandada para uma revista sobre música entraria em debate e seria aceita como coluna (HEYHEY).
Mas, falando sobre KMFDM e o aclamado WWIII, o CD é REALMENTE forte, pancadão eletronico-metal, daqueles pesados, o som é cru e direto como as letras.
Uma coisa que eu amo no metal industrial é a forma direta de passar informação que é completamente contemporanea, direto, rápido, pesado e inovador. Eu encho MUITO a bola do metal industrial, MESMO, porque é um dos poucos generos da nova-música que não cai ao comercial, mas consegue vender e ser arte ao mesmo tempo.
E bem, pra mim, o ouro do CD é From Here On Out.
Tchau Ber, parabens denovo!
KMFDM é muito foda, mas não conheço esse disco.
É uma das bandas de Metal Industrial que mais gosto, ao lado de Ministry, Lard (um Ministry com Jello Biafra) e até mesmo Godflesh.
A não ser que considere Front 242 e Young Gods como Metal...
Ah, sim, claro, muito bom o post/resenha...
A banda de KMFDM são melhor do que os outros cantores, tipo: Eminem, Sarah Brightman. Mais vale ouvir estas músicas do que o Tokio Hotel , como por exemplo. Os TH (Tokio Hotel) são gays de merdas!!!
Viva a Máfia Hora zero!! Ass: johanna K. USA!!
Olá , bom dia
Onde consigo baixar o cd NIHIL !
não sei ao certo se é uma banda ou
se é nome de CD do KMFDM !
alguém pode me ajudar :
Abraço
Sérgio
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