Você já mergulhou nas microfonias sombrias de The Jesus And Mary Chain? Das frases curtas e guitarras vigorosas do My Bloody Valentine? E as viagens dos Stone Roses? Caso não tenha, faça isso imediatamente. E no embalo, aproveite e conheça o Primal Scream, que tem como cabeça principal do grupo o insano, porra louca e brilhante escocês Bobby Gillespie, ex-baterista da banda dos irmãos Reid que em nada fica devendo para os dois em matéria de qualidade musical.
Vindos de uma época em que o rock teve sua mais acertada aproximação e afinidade com a música eletrônica (já que, em tempos atuais, isso foi desgastado por um exército de bandas que fazem apenas pastiche do que já foi feito de melhor), o grupo sempre foi afeito a trips tanto musicais quanto pessoais, levando um estilo de vida tão experimental quanto a sua música, combinando um negro rock com essa música que surgia timidamente e logo iria estourar com ícones noventistas como Daft Punk. Mas antes disso, em casas undergrounds do Reino Unido, levando toda uma geração do final da década de oitenta a ser chamada de acid-house. Nome este, convenhamos, mais que acertado ao combinar as batidas padronizadas e descoladas de um circuito ainda pequeno com a psicodelia alucinógena de um estilo musical já consolidado.
Mas foi no início dos anos noventa, quando Kurt Cobain e seus amigos grunges começaram a despontar na terra do Tio Sam, que Bobby cravou junto com seus companheiros seu disco definitivo, um dos melhores discos da década e, por consegüinte, de toda a história da música recente. O nome era "Screamadelica", e respirava um frescor inteiramente novo. A proposta do disco era, simplesmente, simular todos os efeitos de uma viagem de ecstasy musicalmente. O resultado? Bom, garanto que se algum clubber desse uma olhada (ou melhor, uma ouvida0 nisso aqui, o mercado dessa substância teria um sério concorrente para competir...
Alucinado e genial na mesma proporção, "Screamadelica" cita a tudo e a todos durante a sua viagem pelo subconsciente da cabeça nem um pouco convencional de Gillespie; "Movin' On Up" tem cara de ter saído de algum disco sessentista dos Rolling Stones, tanto que o produtor dessa música é Jimmy Miller, o mesmo do disco "Beggar's Banquet", da turma de Jagger é companhia. Pianos, bongôs, muito groove e um refrão com ginga de negão. "Slip Inside This House" e "Don't Fight It, Feel It" flertam com a música house e a new wave, em perfeito equilíbrio. "Loaded", com vocais gospel, não sabe se é jazz ou dance music, mas ainda assim barbariza. E, caramba, ainda tem "Higher Than The Sun", uma obra-prima totalmente viajante que vão morrer chamando de psicodélica, alucinógena, lisérgica e tantos outros nomes e ainda não chegarão nem perto da experiência surreal, inconsciente e inconsequente que é ouvir essa peça.
O Primal Scream, doido que eles eram, não reinaram absolutos. Seus companheiros de movimento o acompanharam com igual brilhantismo, e todos influenciaram grande parte do Rock que viria a seguir, como toda a geração britpop e grande parte do rock indie atual. E em meio a ainda muita doideira, Bobby Gillespie e seus comparsas ainda continuam representando um oásis de de música criativa - seja, no caso, a atemporalidade do ácido de "Screamadelica" ou seus álbuns mais recentes - instigando e hipnotizando o ouvinte. Por isso, meus caros, apaguem essa porcaria inútil de IDoser dos seus computadores. Se vocês querem sentir barato ouvindo alguma coisa, vão ouvir Primal Scream!
"I've glimpsed,
I have tasted,
fantastical places
My soul's an oasis,
higher than the sun"
Músicas:
01.Movin' On Up
02.Slip Inside This House
03.Don't Fight It, Feel It
04.Higher Than The Sun
05.Inner Flight
06.Come Together
07.Loaded
08.I'm Comin' Down
09.Higher Than The Sun (A Dub Symphony In Two Parts)
10.Shine Like Stars